Lúcia Fernanda Jófei Kaigang (1978 – )

Lúcia Fernanda Jófei Kaingáng nasceu no Rio Grande do Sul e viveu em diferentes aldeias, até ingressar aos 17 anos, no curso de Direito na Universidade Regional do Noroeste do Estado do Rio Grande do Sul (Unijuí) e depois estudou Direito Público na Universidade de Brasília.

Preferia cursar jornalismo, contudo, acabou convencida pelos pais a estudar direito. Era necessário que alguém da cultura Kaigang aprendesse e pudesse traduzir as leis brasileiras para seu povo. A resistência enfrentada veio por parte dos avôs, que duvidavam pudesse a neta aprender com o branco, alguma coisa que não pudesse ser ensinada por um ancião da aldeia.

A advogada Lúcia tornou-se uma das lideranças dos Kaigang, povo que ocupa áreas territoriais no Paraná, São Paulo, Santa Catarina e Rio Grande do Sul e que, de acordo com o censo da Fundação Nacional do Índio (FUNAI), reunia em 2006 cerca de 29 mil pessoas.

Funcionária da FUNAI e vice-presidente do Instituto Indígena Brasileiro para a Propriedade Intelectual (INBRAPI) atuou contra o envio ao Congresso, pelo governo, de um projeto de lei que estabeleceria critérios para o acesso aos recursos genéticos e conhecimentos tradicionais. Lucia argumenta que, embora cerca de 80% dos remédios fitoterápicos tenham como base o conhecimento e as culturas indígenas, isso acaba por não se traduzir em benefício para as aldeias.

Também através do INBRAPI, Lucia luta pelo reconhecimento das tecnologias indígenas e contra os diferentes preconceitos que enfrentam. Segundo ela, ainda hoje, muitos dos livros utilizados pela escola, os apresentam unicamente como um povo que caça e pesca.

Sua geração, afirmou em entrevista, é consciente quanto à importância de chegar à universidade, de lutar pelos direitos subtraídos ao longo da história do Brasil e de enfrentamento dos múltiplos problemas que afetam os (as) indígenas de todo o país, como aculturação, analfabetismo, terras, desnutrição infantil e saúde, dentre outros.

Lucy Lúpia Pinel Balthazar Alves de Pinho (1932 – )

Lucy Lúpia Pinel Balthazar Alves de Pinho

(1932- )

Pioneira da Aviação Comercial Brasileira.

Carioca do Grajaú, bairro do Rio de Janeiro, Lucy Lúpia é filha de Edmundo Pereira Balthazar e Martinha Pinel Balthazar. Educada em um colégio católico para meninas de classe média, Lucy, a seguir, ingressou na Faculdade Federal de Farmácia e Bioquímica da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ).
A trineta do Dr. Philippe Pinel, médico francês pioneiro no tratamento de problemas mentais, apaixonou-se definitivamente pela aviação em 1967, aos 36 anos, ao acompanhar o marido no curso para piloto privado realizado no aeroporto de Nova Iguaçu (RJ).

Das três mulheres, na ocasião, inscritas no curso de pilotagem, apenas Lucy prosseguiu. A decisão que não o faria apenas por esporte, mas sim, para profissionalizar-se, foi cumprida. Sua formação incluiu a parte teórica e os exames de saúde realizados pelo Ministério da Aeronáutica. Em três meses estava com o brevê na mão e começou a enfrentar os primeiros preconceitos.

Seus pais, que souberam apenas após a conclusão do curso, apoiaram e incentivaram a decisão da filha.

Para sobreviver, além de Instrutora de Pilotagem Elementar no mesmo Aeroclube de Nova Iguaçu, onde simultaneamente aprimorava sua formação, acumulando horas de vôo e submetendo-se aos exames da Aeronáutica, durante anos atuou como "free-lancer" em várias cidades e empresas pequenas.

Lucy era a co-piloto, auxiliando comandantes em vôos não visuais e noturnos. Sua primeira contratação ocorreu em 1973. Realizou ainda o curso oferecido pela Embraer para habilitação ao avião Bandeirante, de fabricação nacional.
Posteriormente, submeteu-se à avaliação e voou como comandante e acompanhada por co-piloto. Transferiu-se então para São Paulo, em função de um mercado com maior oferta de trabalho.
Se Lucy recebeu apoio de muitos colegas, não foram poucos os preconceitos que precisou enfrentar como pioneira. Em seu livro Eu Quero Voar – o retrato do preconceito (1979), destaca, entre outros, o argumento de algumas empresas, como aquele em que sairia caro contratá-la, porque seria necessário pagar por um outro quarto que não o oferecido aos comandantes homens. Ou ainda, que sua presença no avião provocaria ciúmes nas esposas dos comandantes. Isso sem esquecer o argumento de que as pessoas teriam medo ao entrar em um avião e dar de cara com uma mulher na cabine de comando. No total Lucy publicou três livros com sua saga.
A própria obtenção da licença para piloto de linha aérea foi uma difícil conquista, como relataria Lucy anos depois. Após completar as horas exigidas pela legislação e fazer a prova teórica para piloto de linha aérea submeteu-se a novo exame de saúde. Aprovada, recebeu como era costume, um cartão provisório, que lhe garantia o direito de em um período de dois anos, prestar exame prático em um avião. Só que a aeronáutica mudou a legislação e Lucy recebeu uma licença de Piloto Comercial Sênior, ficando assim impedida de assumir grandes aviões.
Indignada, denunciou seu caso à imprensa e recorreu resolveu cursar Direito, formando-se apenas em 1984. Seus constantes requerimentos ao Departamento de Aviação Civil (DAC) eram indeferidos até que, vinte e quatro anos depois, em 2000, finalmente recebeu pelos correios a tão desejada carteira, retroativa a 1976.
Mais que fazer justiça, a persistência de Lucy lhe garantiu a primazia de mulher piloto da aviação comercial brasileira e ainda, na América Latina, segundo " Conquistadors of the Sky", de Dan Hagedorn, publicado em 1999.

Berta Loran (1926 – )

Berta Loran ( 1926 – )

Atriz

Nascida Baja Ajs, em Varsóvia (Polônia) chegou ao Brasil aos 11 anos, em 1939, junto com a família judia, fugindo da Segunda Guerra e dias antes da invasão alemã à Polônia. Dos seis irmãos, aquele que permaneceu na Polônia morreu vítima da invasão nazista. Seu pai tomou a decisão de vir para o Brasil, após ouvir pelo rádio a um programa nazista que ameaçava de extermínio os judeus poloneses. Baja ou Berta é mais uma das muitas mulheres estrangeiras, como Carmem Miranda, Henriette Morineau, Elke Maravilha e Lola Brah que adotaram o Brasil no coração e contribuíram para a vida cultural do país.
Apoiada pela mãe Clara e levada pelo pai, José Ajs, que além de alfaiate atuava como ator, iniciou a vida artística com pequenas comédias apresentadas em clubes da comunidade judaica sempre no idioma idsh. Aos 21 anos, após casar-se com o ator Handfuss, trinta anos mais velho, mudou-se para Buenos Aires onde permaneceu por dois anos.
Em 1955, período das chanchadas brasileiras fez sua estréia no cinema em Sinfonia Carioca, de Watson Macedo. Sua estréia na televisão brasileira ocorreu na extinta TV Tupi, de onde rumou para o teatro de revista. O sucesso da peça Fogo no Pandeiro, a levou a Portugal em 1957, onde permaneceu por seis anos, consagrando-se como atriz cômica. Em 1963, ao retornar ao Brasil, por intermédio de Bibi Ferreira, foi trabalhar na TV Record.
Contratada pela TV Globo participou de vários programas de sucesso, dentre eles, a versão para a televisão de Balança mas não cai. Seu retorno aos palcos ocorreu em 2008, mesmo ano em que apareceu nas telas, no filme Polaróides Urbanas, de Miguel Falabella.
Berta além de atriz tem ainda no currículo trabalhos como diretora. Dentre as muitas homenagens que recebeu durante a vida, destaca-se aquela recebida em 1996, no Dia Internacional da Mulher, concedida pela Câmara Municipal do Rio de Janeiro.

 

Leocádia Felizardo Prestes (1874 – 1943)

Leocádia Felizardo Prestes (1874- 1943)

Ativista Política que enfrentou a Ditadura Vargas e o Nazismo.

Nascida em Porto Alegre (RS), Leocádia Felizardo Prestes era filha de Ermelinda Ferreira de Almeida, descendente da aristocracia portuguesa e de Joaquim José Felizardo, abastado comerciante.
Com os pais aprendeu a valorizar e a lutar pelos ideais de justiça social, ao mesmo tempo em que recebia a rígida educação tradicional de seu tempo destinada às meninas: aprendizado de idiomas, piano, pintura, canto e declamação.
Adolescente interessava-se em acompanhar os jornais da Corte, fato pouco comum para as moças. A contragosto dos pais formou-se professora e em várias ocasiões, expressou a eles seu desejo de tornar-se professora de escola pública, o que não lhe foi permitido.
Em 1896, por amor, casou-se com Antônio Pereira Prestes, engenheiro militar e ex-aluno de Benjamim Constant, na Escola Militar da Praia Vermelha, no Rio de Janeiro. O convívio com o marido, adepto do positivismo e que, ainda cadete, participara da Proclamação da República permitiu a Leocádia ampliar seu conhecimento do mundo, bem como, o interesse pela política. Dentre as historias contadas, anos mais tarde, aos filhos, estariam aquelas sobre a ansiedade experimentada pelo casal durante a Guerra dos Canudos.
O falecimento do marido colocou-a e aos cinco filhos em difícil situação financeira. Na luta pela sobrevivência, deu aulas de idioma, foi modista e costureira até que, em 1915, conseguiu uma nomeação para atuar como professora em escolas públicas.
Como professora durante quinze anos, até 1930, Leocádia atuou em cursos noturnos voltados a trabalhadores (as), em escolas do subúrbio do Rio de Janeiro freqüentemente localizadas no alto dos morros. Travou assim, contato com a dura realidade enfrentada pelas camadas mais empobrecidas da sociedade brasileira, aumentando ainda mais sua indignação contra a injustiça social.
Na educação dos filhos, além do pão de cada dia, Leocádia Prestes preocupou-se sempre em alimentá-los também, com o respeito ao próximo, a responsabilidade para com o trabalho e o compromisso pessoal de enfrentar injustiças. Não por acaso, em 1910, adepta da Campanha Civilista de Rui Barbosa, participava dos comícios levando sempre Luiz Carlos Prestes, o filho mais velho.
Assim, em 1922, quando Luiz Carlos, já oficial do Exército, se envolve na revolta promovida por alguns oficiais contra o governo, é apoiado pela mãe que, inclusive, aconselha-o a não desistir diante do fracasso do movimento.
Durante o levante de 1924, liderado por Prestes, que se espalhou pelo interior do país e durariam até 1927, os anos foram difíceis. As noticias que chegavam do interior vinham apenas dos jornais que apoiavam o governo e eram as piores possíveis. Por sua coragem, apoio ao filho e aos demais participantes, Leocádia Prestes tornou-se uma líder das famílias atingidas.
Em 1930, com o filho novamente perseguido pelo governo, entendeu que o mesmo não poderia retornar ao país. Deixando tudo para trás, rumou para a Argentina com as quatro filhas e ficou ao lado de Luiz. Período difícil.
Ameaçado de morte pelo governo argentino, Luiz Carlos teve que fugir para o Uruguai. Leocádia – que não mais pisaria no Brasil-, e as filhas, enfrentaram muitas dificuldades para sobreviver em Buenos Aires, onde permaneceram e se aproximaram do marxismo. Em 1931, Leocádia e a família se juntam ao filho na União Soviética.
Cinco anos depois, em 1936, com a prisão de Luiz Carlos Prestes- que vivia clandestinamente no Brasil-, e sua mulher Olga Benário, Leocádia é escolhida para encabeçar uma campanha política em defesa da vida do filho e de todos os presos políticos brasileiros. Apesar das dificuldades e da responsabilidade da missão, aos 62 anos, parte de Moscou acompanhada da filha Lygia e percorre os principais países europeus denunciando e pedindo apoio a sua causa.
Os comícios, conferências de imprensa, visitas a jornais, contatos com diferentes sindicatos, partidos políticos, parlamentos e chefes de governos deram resultado. De diferentes partes do mundo, o governo brasileiro recebia milhares de protestos. Em pouco tempo Leocádia vê surgir Comitês de defesa de Prestes nos Estados Unidos, na América Latina, na Austrália e na Nova Zelândia.
Com a extradição da nora grávida, Olga Benário, para a Alemanha Nazista, Leocádia e a filha vão à Genebra pedir ajuda à Cruz Vermelha Internacional, ação que permitiu receber em 1937, notícias sobre o nascimento da neta Anita.
Leocádia esteve ainda, por três vezes, na Alemanha, onde exigiu da Gestapo a libertação da nora e da neta. Também delegações de vários países foram a Berlim interceder pela libertação. Leocádia recebeu Anita nos braços, então com dois anos, apenas em 1938. Não conseguiu, contudo, salvar Olga, executada na câmara de gás do campo de concentração de Ravensbrück, em 1942.
Com a chegada da guerra, Leocádia e a neta se exilam no México, de onde prossegue a campanha em favor do filho e companheiros (as). Além de haver perdido contato com as filhas que ficaram em Moscou, preocupa-a também a expansão nazista na Europa.
Em junho de 1943, Leocádia Prestes falece sem assistir ao final da guerra e à libertação do filho. Seu enterro foi acompanhado por uma multidão e seu caixão coberto pela bandeira brasileira. Uma guarda de honra levou bandeiras das nações unidas que lutavam contra o nazismo. Além do discurso de representantes de vários países latino americanos, o poeta chileno Pablo Neruda leu o poema Dura Elegia, escrito em homenagem a Leocádia.

 

 

Lia Torá (1904 – 1972)

Primeira brasileira a filmar em Hollywood, fundar uma companhia cinematográfica nos Estados Unidos e a escrever roteiros de filmes.

Nascida Horácia Corrêa D´Ávila, em 12 de maios de 1904, no bairro de São Cristóvão, no Rio de Janeiro, era descendente de espanhóis e de portugueses. Após curso na Academia de Dança, em Barcelona, integrou o corpo de dança da mundialmente conhecida Companhia Revista Velasco.

Regressando ao Brasil conhece e se apaixona por Julio Moraes, casado, pai, herdeiro de uma das maiores fortunas do país, com quem se casa, rompendo preconceitos. Lia torna-se mãe dos gêmeos Mario Júlio e Júlio Mário.

Em 1926 seu sonho de ser uma estrela do cinema começa a ganhar força. Lia participa do Concurso de Belleza Photogênica Feminina e Varonil da Fox Film, que realizado em vários países, buscava busca formar um casal de atores para atuar em Hollywood.

Dois anos depois e residindo na Suíça com a família, Lia Torá recebe um telegrama da Fox comunicando haver sido escolhida no lugar de Eva Nil que, tendo nascido no Egito, precisou desistir da competição por não ser brasileira como exigia o regulamento. Lia faria par com o repórter Olympio Guilherme, que se encontrava então no bairro da Urca, no Rio de Janeiro, fazendo a cobertura do concurso para um jornal de São Paulo.

Apesar da resistência inicial do marido Lia seguiu para Hollywood. Sua grande chance ocorreu em 1929, quando estrelou ´The Veiled Woman´ (A Mulher Enigma), escrito por ela e dirigido por Emmett Flynn. Em 1930, ela e Olympio Guimarães participaram como Mestres de Cerimônia, em “King of Jazz” e, em 1931, trabalhou em “Don Juan Diplomático”, de Arthur Gregor e “Soñadores de la Glária”, de Miguel Torres.

O cinema mudo chegava ao fim com o aparecimento do som. Lia Torá falava espanhol, português e francês, contudo, não dominava com perfeição o inglês. Com o final de seu contrato com a Fox se aproximando e percebendo o que acontecia, fundou sua própria companhia cinematográfica, a Brasilian Southern Cross Production. Sua despedida das telas americanas foi em “Hollywood Ciudad de Insueño”, escrito e estrelado pelo ator chileno José Bohr.

Retornando ao Brasil, Lia Torá morou no bairro da Tijuca, no Rio de Janeiro e se dedicou ao automobilismo, sua segunda grande paixão, tornando-se conhecida no circuito do bairro da Gávea. Em 1971, um ano antes de seu falecimento, participou do filme As Confissões de Frei Abóbora, dirigido por Braz Chediak, ao lado de nomes como Tarcísio Meira e Norma Bengel, entre outros.

Maria Pankararu (1964 – )

Maria Pankararu (1964 – )

Primeira mulher indígena com doutorado

Maria das Dores de Oliveira, Maria Pankararu, como ficou conhecida, é filha de Cícero Manoel de Oliveira e Tereza Freire, índios da etnia pankararu. Nasceu em 1964, na aldeia Brejo dos Padres Tacaratu, em Pernambuco.

Ainda criança, precisava andar a pé por cerca de uma hora e meia, para chegar à sala de aula mais próxima de sua aldeia. Fugindo da difícil situação no campo a família transfere-se, em 1970, para São Paulo, onde conclui o curso primário. A partir dai foram constantes as idas e vindas entre o sudeste e o nordeste.

Na Universidade Federal de Alagoas (UFAL), quando morava em Maceió, graduou-se em história (1990) e pedagogia (1997). No mesmo período, assumiu na Fundação Nacional do Índio (FUNAI) de Alagoas, a função de docente, atuando em tribos indígenas.

Sempre na UFAL, com bolsa da Fundação de Amparo à Pesquisa de Alagoas, conclui o mestrado em lingüística (2001), tornando-se, na ocasião, a segunda mulher indígena a fazê-lo.

Em 2002, obteve da Fundação Ford uma bolsa para o doutorado, no primeiro ano em que a fundação, adotando no Brasil critérios de ação afirmativa, propiciou que dos 42 candidatos inscritos para o processo de seleção, mais que 90% dos escolhidos (as) fossem negros, pardos ou indígenas.

Sua pesquisa sobre a língua indígena Ofayé, tomou como referência os únicos onze índios que ainda a falam, em uma tribo localizada em Brasilândia, interior do Mato Grosso do Sul (MS). Na própria tribo de Maria Pankararu, os indígenas desconhecem a língua de seus antepassados.

A defesa da tese (2006) “Afoyé, a língua do povo do mel”, ocorreu em 19 de abril, oficialmente comemorado como o Dia do Índio. Justamente para que todos os dias possam ser comemorados como das diferentes culturas indígenas brasileiras, luta Maria Pankararu. Uma grande festa em sua aldeia natal comemorou o feito ilustre de uma de suas filhas, que havia se tornado, pela UFAL, a primeira mulher indígena com doutorado.

A partir dos resultados da pesquisa e em parceria com professora Marilda de Souza, desenvolveu uma cartilha com a gramática da tribo, o que pode significar o resgate de uma língua para a geração presente e futura.

Seu empenho pessoal, o apoio dos amigos (as) e pais, bem como, o fato que em sua aldeia as mulheres conquistaram o direito de voz, foram fatores essenciais para estimulá-la na vida acadêmica. Tudo isso a ajudou também a enfrentar os muitos preconceitos que ainda persistem na sociedade brasileira contra os(as) indígenas afirmaria, anos mais tarde, Maria Pankararu em entrevistas.

Maria Pankararu recebeu a comenda Heliônia Ceres e a Medalha do Mérito Universitário- UFAL 45 anos, concedida pelo Núcleo Temático Mulher e Cidadania da UFAL. Em 2009, substituindo o ex-conselheiro Gersem Luciano Baniwa, integrou o Conselho Nacional de Educação (CNE).

Neide Aparecida (1937 – )

Neide Aparecida (1937- xxx )

Pioneira da televisão brasileira

Neide Aparecida da Silva, atriz e apresentadora dos primórdios da televisão brasileira, na década de 50/70, nasceu na capital paulista, em 1937.

Ainda menor de idade, em 1954, foi contratada pela extinta TV Tupi do Rio de Janeiro, onde circulava acompanhada pela mãe para atuar como garota-propaganda, na época dos “reclames”, de um produto chamado “Discoteca Stylus”.

Destacou-se pela apresentação de comerciais ao vivo e posteriormente, por comandar programas infantis de grande sucesso. Dentre os prêmios que recebeu ao longo do trabalho na televisão destacam-se, “Melhor Apresentadora”, “A Mais Elegante” e a “Mais Bela da TV”. Em 1970 foi coroada “Rainha dos Artistas”.

Atuou em filmes nacionais e em programas de televisão nas décadas de 1970 e 1980. Em 1997 comandou um programa sobre a memória da televisão brasileira.

 

Gertrudes Maria (século XIX)

Gertrudes Maria (século XIX)

Negra alforriada que recorreu aos tribunais para manter sua liberdade.

Em um universo social predominantemente branco e masculino, desfavorável à mulher, sobretudo, aos/as negros/as e escravizadas/os, Gertrudes Maria, negra alforriada sob condição, que vivia na capital da Paraíba na década de 1820, entrou na justiça contra dois credores de seu senhor, que pediam sua comercialização em troca do pagamento de dívidas.

O processo teve inicio em 08 de julho de 1828. Através de seu procurador, Gertrudes argumentou que não poderia ser penhorada desde 27 de janeiro de 1826, data em que havia pago 100$000 ao dono. Sua carta de liberdade estipulava que estaria completamente livre, quando a esposa de seu proprietário viesse a falecer.

Em 1841, após inúmeras audiências, inclusive, com a extinção da ouvidoria onde corria o processo, ela e os dois filhos foram presos, como resultado de nova ação movida pelos interessados em seu leilão. As alegações para a decisão da justiça incluíam o fato que, além do não pagamento da dívida por seu proprietário, Gertrudes Maria não havia sido cuidada por seu depositário, representante legal e guardião designado pela justiça em 1828, e como conseqüência, se tornara mãe de duas crianças geradas em relação de concubinato com um índio.

Mesmo encarcerada continuou a batalha. Temia ainda que suas crianças também pudessem ser “ganhas” pelos que moviam a ação. Seu pedido de um novo depositário foi aceito e em dezembro de 1841 saiu da cadeia pública.

Gertrudes Maria deu continuidade ao processo, através de seu antigo advogado, com encaminhamento ao órgão superior em Pernambuco. Os autos, segundo registros históricos existentes, datam de maio de 1842.

Embora não existam indicações sobre o desfecho da situação, a luta da negra alforriada e pobre, Gertrudes Maria, contra o sistema escravagista brasileiro e ao silêncio imposto às mulheres, merece registro na história negra e feminina do país.

Raquel Solano Trindade (1936 – )

RAQUEL SOLANO TRINDADE (1936-)

Ativista da cultura negra, artista plástica, poeta, dançarina e coreógrafa

Raquel Trindade Souza, a Kambinda, filha mais velha do grande poeta negro Solano Trindade e Maria Margarida Trindade, coreógrafa e terapeuta ocupacional nasceu no Recife( PE). Sua mãe trabalhou por 25 anos com a psiquiatra Nize da Silveira ao transferir-se para o Rio de Janeiro.

Música, cultura e história correm por suas veias desde a infância. A avó materna Damázia Maria do Nascimento, cozinheira, dançava nos maracatus do Recife e Emerenciana, avó paterna, fazia lapinha, a casinha do presépio. Abílio Pompilho da Trindade, seu avô, sapateiro, era velho do pastoril e com ele Raquel ouviu muitas histórias que povoavam sua imaginação.
Seu pai, que em 1936 fundara o Centro Cultural Afro-Brasileiro e a Frente Negra Pernambucana, transfere-se para o Rio de Janeiro na década de 1940 onde, de cristão evangélico passa a militante comunista, filiando-se ao partido de Luiz Carlos Prestes. Em Caxias (RJ), município onde se instalou, montou a célula Tiradentes reunindo camponeses e operários.
Cansada de esperar que o marido enviasse dinheiro para a família vir encontrá-lo, apesar do receio do avô, na época corria a história que os alemães andavam afundando navios brasileiros, sua mãe rumou com as filhas Raquel e Godiva para o Rio de Janeiro. As meninas ficaram no navio e Maria Margarida saiu para procurar o marido. Sua única referência era o vermelhinho, um bar que reunia comunistas e onde Solano, seu pai, aparecia para conversar e vender quadros e poemas.
A família foi então morar no bairro da Gamboa, em um barraco que tinha o aluguel cotizado pelos amigos do pai. Com ele, a partir dos oito anos passou a freqüentar a Biblioteca Nacional, exposições de arte, Pinacoteca e Teatro Municipal. Conheceu também o balé-afro da Mercedes Batista e a orquestra afro-brasileira do Abigail Moura.
Seus pais ensinavam dança no Teatro Folclórico do Aroldo Costa e por intermédio deles conviveu com intelectuais da época, dentre eles, o artista plástico Aldemir Martins, a pintora Djanira, a atriz Ruth de Souza e Abdias Nascimento, criador do Teatro Experimental do Negro.
Com a mudança para o município de Duque de Caxias (RJ), Solano promoveu várias festas com Maracatu, Coco e Lundu danças ensinadas pela mãe. Também com os pais aprendeu que devia ter orgulho por ser negra e transitou entre o universo evangélico da mãe e as reuniões comunistas, coordenadas pelo pai. Envolvimento político que o levou, inclusive, por duas vezes à prisão, no período do Estado Novo. Anos mais tarde Raquel lembraria que, na estante de sua casa conviviam, lado a lado, na mesma prateleira, a bíblia da mãe e um exemplar de O Capital, de Marx, pertencente a seu pai.
Em 1950 seus pais e o sociólogo Édison Carneiro fundaram em Caxias o Teatro Popular Brasileiro (TPB) que, formado pela classe popular- donas de casa, operários (as), estudantes-, trabalhavam as origens de danças como maracatu, bumba-meu-boi e promovia, ainda, cursos de interpretação e dicção. As apresentações atraiam intelectuais, diplomatas e artistas.

Raquel que se casou oito vezes tem três filhos – o compositor Vitor da Trindade, a artista culinária Regina Célia e a escritora dançarina Dada- e netos. Lembra que um dos casamentos aconteceu após uma viagem do TPB a Europa. Ela perdeu a virgindade no navio, com um dos músicos da equipe do pai, que ao descobrir ficou uma fera. O pessoal então, com a ajuda do cônsul, organizou o casamento em Varsóvia, na Polônia. No retorno a Caxias era uma senhora casada e assim ficou por três anos.

Na ocasião dessa viagem Raquel cursava o segundo ano do Clássico em um colégio particular no bairro de Laranjeiras e no qual só pode matricular-se, com a ajuda do professor Mira, que pagava as mensalidades. Mira era negro e Raquel lembraria, anos mais tarde, que isso não era uma coisa tão comum naqueles tempos: um professor negro de história.

Raquel aprendeu com os pais que o estudo é um dos mais preciosos bens que alguém pode deixar aos filhos. Gostava de estudar e lamenta que atualmente as crianças saiam das escolas sem que dominem a leitura, a escrita e o cálculo. Aos 12 anos ganhou o Prêmio Euclides da Cunha de literatura juvenil, competição nacional, com uma redação sobre a violência presente nos gibis da época

Guarda saudades das professoras. Após a conclusão do curso primário cursou o ginásio no colégio Duque de Caxias e vivia com as mensalidades atrasadas. Estabelecimento particular- ela e sua colega Dagmar eram as únicas meninas negras do colégio. Na adolescência Kafka, Dostoievski e Graciliano Ramos, dentre outros, emprestados pela biblioteca do colégio, foram alguns de seus companheiros. Também a revista A Classe Operária a tirava do serviço de casa o que provocava reclamações da mãe. Raquel passava horas lendo.

Raquel Trindade é Fundadora do TPST (Teatro Popular Solano Trindade) e da Nação Kambinda de Maracatu, instalados na cidade paulista de Embu das Artes, para onde a família se mudou na década de 1960. Fundado em 1975 e administrado pela família o TPST faz parte da luta, para que a memória de Solano, o Poeta do Povo, falecido em 1974, permaneça viva.
O espaço que passou por sérias dificuldades financeiras foi reinaugurado em 13 de novembro de 2010. Das apresentações ocorridas no evento, que reuniu cerca de 700 pessoas, participaram também Vitor Trindade, neto do poeta, tocando solo, voz e violão, a partir de poemas do avô e Manuel Trindade, Bisneto, com sua banda Preto Soul. Maria Trindade, bisneta, com o percursionista Carlos Caçapava apresentou a cultura africana através dos tambores e Raquel empolgou o com suas danças e ritmos que resgatam a e a cultura popular brasileira.
Raquel sempre participou de Encontros e Conferências sobre a cultura negra, realiza cursos e oficinas livres por todo o país. Em 1988 foi convidada para lecionar aulas de folclore, teatro negro e sincretismo religioso na graduação da Unicamp, mesmo não tendo diploma universitário. Período, no qual enfrentou enorme resistência por parte de muitos dos(as) professores(as), após ter sido promovida pela universidade, de técnico didático a professora. Para Raquel, como conseqüência de sua mediunidade desenvolvida no candomblé, era como se uma enorme porta de vidro a impedisse de entrar na universidade para lecionar. Pressionada e com a descoberta de um câncer no intestino pediu demissão, retornando à Embu.
Na ocasião havia proposto um curso de extensão, no sentido de ampliar a reduzida presença negra na universidade. O sucesso da proposta, 170 alunos(as) inscritos, resultou na idéia de criar um grupo batizado de Urucungos, Puítas e Quinjengues, instrumentos bantos que foram trazidos pelos escravos para São Paulo. Composto por negros da comunidade, funcionários da Unicamp, alunos e professores, a maior parte das danças que o grupo apresenta foram pesquisadas e criadas por Raquel.

Valiosa fonte de conhecimento e vivência da cultura afro-brasileira, Raquel Trindade é uma de suas mais importantes Griot (guardiã do conhecimento). Sua atuação e testemunho têm sido de grande contribuição para o enfrentamento do preconceito contra o(a) negro(a), a mulher e o nordestino(a) na sociedade brasileira.

Guiomar Nunes (1692 – 1731)

Guiomar Nunes (1692 – 1731)

Cristã-nova brasileira vítima da Inquisição

Guiomar Nunes foi uma das mulheres condenadas à morte pelo Tribunal da Santa Inquisição. Além dela, cerca de outros vinte e oito brasileiros(as) encontraram o mesmo fim.

Pernambucana, morava no Engenho de Santo André, no Estado da Paraíba. Filha de um mestre de açúcar era casada com Francisco Pereira, fabricante de latas, com quem tinha oito filhos.

Guiomar foi presa em 1729, aos 37 anos, ainda em Pernambuco e conduzida a Lisboa. No Brasil, de acordo com registros históricos, nunca houve uma fogueira. O Tribunal instalado na cidade pernambucana de Olinda, único no Brasil, servia ao julgamento de casos considerados de menor gravidade.

Em 1731, após o auto-de-fé organizado para julgar o seu caso, acusação de prática de judaísmo, recebeu a pena máxima sendo queimada em praça pública. As outras penas aplicadas, a crimes como sodomia, bigamia, libertinagem, feitiçaria e leitura de livros não autorizados pelo Santo Ofício, dentre outros além do confisco dos bens, eram o cárcere perpétuo e o degredo. Na melhor das hipóteses ficava o condenado apenas impedido de assumir cargo público.