Eny Cezarino (1916-1997)

  • Volume 2
  • Século: XX
  • Estado: SP
  • Etnia: Branca
  • Atividade: Profissional do Sexo

Descrição:

Eny Cezarino (1916-1997)

Profissional do sexo

Eny Cezarino nasceu no bairro da Aclimação (SP) em 1916. Filha do italiano José Cesarino- que desembarcou no Brasil de um navio infestado pelo cólera, quando o país ainda praticava a escravidão- , e da francesa Angelina Bassoti Cesarino, recebeu da família uma educação tradicional, com direito a colégio de freiras e criação para arrumar um bom casamento.
De sua juventude, duas lembranças a acompanhariam a vida toda. A descoberta sexual com uma amiga de colégio, dois anos mais velha e a perda da virgindade, com o pai de um amigo, por simples curiosidade, como relataria décadas depois.
Após fugir de casa trabalhou como prostituta em São Paulo, Porto Alegre e Paranaguá (PR), mundo ao qual foi apresentada pelo gigolô e namorado Germano Flores, um carioca que conheceu ao frequentar as noitadas do Cassino da Urca (RJ). Anos mais tarde diria Eny, que a prostituição foi a melhor opção para não se tornar uma entregadora de marmitas, como a irmã, ou operária de fábrica de chocolates, como muitas amigas de sua cidade natal.
Na década de 1940 se transferiu para a cidade de Bauru, como uma das meninas da Pensão Imperial e posteriormente, comprou o bordel e passou a gerente.
Em poucos anos tornou-se poderosa, influente, amiga de políticos e dona do maior e mais luxuoso bordel do país, o Eny’s Bar, também em Bauru, em um imóvel comprado fora do perímetro da cidade, atendendo a uma lei municipal.
Entre 1963 e 1983, época auge, Eny chegou a ter cerca de 70 meninas, inclusive, estrangeiras, trabalhando em sua casa de quarenta quartos, saunas, jardins, restaurante, piscina, bares e salões de festas. Festas de confraternização de empresas e convenções de políticos, em pleno regime militar, eram comuns.

Ciente do filão que explorava, oferecia aos ilustres clientes o sigilo absoluto de meninas bonitas, elegantemente vestidas, asseadas e regularmente atendidas por um médico, que cuidava, ainda, para que não engravidassem. As moças podiam estudar e eram obrigadas a optar por um, dentre os três perfumes franceses recomendados por madame Eny. Aquelas que vinham de fora eram “orientadas” a trazer seu título de eleitora para a cidade.
Acontece que sexo não era tudo que Eny oferecia. Ela fazia campanhas politicas, angariava votos e ajudava a eleger amigos. Por isso, provavelmente, seu bordel era o único instalado perto da rodovia, longe da área reservada aos demais prostíbulos da cidade. Também por sua influência junto às autoridades, sempre resolveu rapidamente todos os poucos problemas que teve com a polícia, como aquele do uísque contrabandeado do Paraguai.
Seus familiares sabiam de sua profissão e recebiam mensalmente uma ajuda financeira enviada por Eny. Deles não recebia aprovação e nem desprezo. A exceção era sua avó, Rosa, para quem a neta era filha do pecado e, por isso, nunca mais lhe dirigiu a palavra.
O dinheiro de Eny financiava creches, escolas e obras sociais mantidas por irmãs de caridade, tornando-a uma figura pública e apesar do preconceito enfrentado, uma benemérita na cidade.
Sobre sua clientela é dada como certa, pelos moradores mais antigos da cidade, a presença de fazendeiros, padres, políticos, o poeta Vinicius de Moraes, governadores paulistas, artistas, presidentes da república e até de um príncipe austríaco, que esteve na cidade, certa ocasião, para instalar uma cervejaria.
Apesar do império que construiu, chegando a possuir vinte e seis imóveis, Eny que não teve filhos e foi casada durante muitos anos, morreu pobre e em uma cama de hospital, aos sessenta e nove anos, em 1987.
Sobre sua decadência, Eny culpava a mudança dos costumes sexuais e os anticoncepcionais, que liberaram às chamadas “moças direitas” o sexo com os namorados. Acusava também a péssima atuação de seu contador. A casa de Eny, famosa não apenas pelos sanduiches de rosbife que servia, pertence atualmente a um ex-deputado estadual e permanece fechada.
Em 2002, quinze anos após sua morte, a vida dessa mulher que revolucionou costumes, deu origem ao livro Eny e o grande bordel brasileiro, de Lucius de Mello, publicado pela Editora Objetiva.